A reação soviética ao pouso na Lua? Negar que a URSS também quisesse chegar lá
Todos conhecem várias teorias da conspiração dizendo que o pouso na Lua foi uma farsa (elas são falsas e podem ser facilmente desmascaradas). Mas você já ouviu falar na tese que afirma que a própria competição para chegar lá não existiu, já que a União Soviética jamais teria tentado fazer uma viagem lunar antes dos Estados Unidos?
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Pois foi isso que os soviéticos alegaram para tentar encobrir seu fracassado programa de pouso lunar. A mentira resistiu firmemente até 1989, quando um grupo de engenheiros aeroespaciais dos Estados Unidos foi a Moscou e finalmente viu a nave que os soviéticos pretendiam enviar à Lua.
O presidente John F. Kennedy instigou a corrida espacial em 1961 ao anunciar que os EUA colocariam um homem na Lua até o final da década. A partir daí, o programa da NASA para chegar ao satélite natural da Terra antes dos soviéticos se tornou público. Já a União Soviética não divulgou seu próprio programa, nem admitiu oficialmente que ele existisse. Depois que os EUA conquistaram o feito, em 20 de julho de 1969, a URSS ainda continuou a investir em seu projeto de pouso lunar, ao mesmo tempo em que negava publicamente sua existência.
No início, "o sigilo era necessário para que ninguém nos alcançasse", escreveu o jornalista Yaroslav Golovanov no jornal soviético Komsomolskaya Pravda. “Mas depois, quando nos ultrapassaram, tivemos que manter segredo para que ninguém soubesse que havíamos sido ultrapassados”.
Porta-vozes soviéticos também disseram que o país estava mais interessado em criar satélites e enviar sondas robóticas à Lua do que em missões tripuladas que colocariam vidas humanas em risco. Em transmissões para a América Latina, África e Ásia, a Rádio Moscou classificou a missão Apollo 11 como “um esbanjamento fanático da riqueza saqueada dos povos oprimidos do mundo em desenvolvimento”.
Para muitos que trabalharam em pesquisas aeroespaciais nos Estados Unidos, essa negação nunca foi convincente. Uma dessas pessoas foi James Oberg, engenheiro espacial da NASA entre 1975 a 1997, que fala russo e escreveu vários livros sobre os programas espaciais dos EUA e URSS. Em 1979, ele escreveu um artigo para a Reason Magazine argumentando: "Muitos dos mesmos elementos que caracterizaram os preparativos para os desembarques da missão Apollo na Lua também estavam presentes no programa soviético". Ele também observou que os cosmonautas soviéticos, durante a década de 1960, falavam como se estivessem em uma corrida com os EUA até a Lua.
"Posso afirmar que a União Soviética não será derrotada pelos Estados Unidos na corrida para levar um ser humano para a Lua", disse o cosmonauta Vladimir Komarov em 1966, um ano antes de sua trágica morte durante sua reentrada na Terra. "Os EUA têm um cronograma de '1969 mais X', mas nosso cronograma é '1969 mais X menos um'!" - ou seja, os soviéticos acreditavam que chegariam à Lua um ano antes que os Estados Unidos.
No entanto, parte da população dos EUA acabou influenciada pela propaganda soviética e começou a suspeitar que o governo dos EUA havia inventado a competição para justificar o enorme investimento financeiro na missão lunar da NASA.
Algumas dessas pessoas eram muito influentes. O senador J. William Fulbright disse em 1963 que "a provável verdade é que estamos numa corrida não com os russos, mas com nós mesmos". E um editorial de 1964 do New York Times intitulado "Debatendo a corrida para a Lua" dizia o seguinte: “Ainda há tempo para cancelar o que se tornou uma corrida de uma só nação”. No quinto aniversário do pouso na Lua em julho de 1974, o apresentador de TV Walter Cronkite disse que “os russos nunca estiveram na corrida”.
Na verdade, os soviéticos estavam em uma corrida lunar com os EUA durante a década de 1960, mas tinham confiança que poderiam derrotar os rivais porque "eles alcançaram antes todos os primeiros lugares". Diz Oberg: “eles tiveram o primeiro satélite, a primeira sonda a pousar na Lua e colocaram o primeiro homem e a primeira mulher no espaço. De fato, os soviéticos achavam que o cronograma dos EUA para chegar à Lua não passava de publicidade, pois tudo parecia ambicioso demais”.
Quando a Apollo 11 realmente chegou lá em 1969, apenas oito anos após o anúncio do programa, Oberg disse que os soviéticos “lentamente perceberam que haviam acordado o gigante adormecido; que eles tinham deixado o governo dos EUA louco o suficiente para gastar quantias absurdas para conquistar seu objetivo”. Ainda assim, os soviéticos continuaram seu programa lunar no início dos anos 70 pois não sabiam se os EUA continuariam sua exploração no satélite natural da Terra.
"Se os EUA tivessem um revés e desistissem ou apenas se cansassem e parassem, então [os soviéticos] poderiam seguir em frente e superar o voo lunar dos rivais", diz ele. “Mas em 1972, eles perceberam que simplesmente não tinham condições para construir foguetes ou uma espaçonave confiáveis o suficiente para chegar na Lua”. Embora a URSS tenha produzido um módulo lunar destinado para o uso dos cosmonautas, não havia como concluir a missão de forma segura.
O fato de os soviéticos terem construído uma nave destinada a pousar na Lua permaneceu em segredo até 1989, quando engenheiros aeroespaciais norte-americanos do Massachusetts Institute of Technology (MIT) visitaram o laboratório de engenharia estudantil do Instituto de Aviação de Moscou. Mesmo assim, a revelação aconteceu de modo praticamente acidental, conta Laurence Young, que estava na visita e agora é professor emérito de aeronáutica e astronáutica do MIT.
A delegação do MIT havia visitado o Instituto de Aviação de Moscou para discutir possíveis programas educacionais conjuntos entre as universidades. Isso aconteceu durante os últimos dias da União Soviética e o período de glasnost, ou "abertura", quando o país estava compartilhando mais informações com os EUA. Durante a reunião, os soviéticos levaram os americanos para um passeio por um grande salão cheio de naves espaciais que eles usaram como um laboratório de ensino.
“Ao percorrermos o corredor, Ed Crawley [outro engenheiro do MIT] e eu vimos essa espaçonave”, diz Young. “Eu disse: 'O que é essa coisa que parece com o nosso módulo lunar?'” Os soviéticos responderam que era o seu próprio módulo lunar. Young perguntou se eles não queriam dizer que aquele era um protótipo e não uma nave real que eles pretendiam enviar para a Lua.
"Eles disseram: Essa é a nave que iria para a Lua", afirma ele. "Eu não sabia se acreditava". Young e seus colegas presumiam que a União Soviética tinha um programa para enviar seres humanos à Lua, "mas não tínhamos nenhuma evidência disso", diz ele. "Isso é que tornou essa descoberta completamente acidental ... tão incrível para nós", completa.
Os engenheiros tiraram algumas fotos do módulo lunar soviético e, quando voltaram ao MIT, a universidade divulgou uma nota sobre o assunto para a imprensa. Em 18 de dezembro de 1989, o New York Times - que uma vez havia acusado os EUA de comandar “uma corrida de uma só nação” até a Lua - publicou uma manchete de primeira página declarando: “Agora, os soviéticos reconhecem que havia uma corrida lunar”.
Texto: Becky Little/History.com
Imagem: Gilmanshin/Shutterstock.com