Como a condenação aos terríveis experimentos nazistas abriu os caminhos para a bioética
Em 9 de dezembro de 1946, um Tribunal Militar Internacional, integrado por juízes dos países aliados – Estados Unidos, Grã-Bretanha, França e União Soviética – julgou três oficiais e 20 médicos, sob a acusação de crimes contra a humanidade. Entre eles, estava a realização de experimentos médicos nazistas em prisioneiros de guerra e civis de países ocupados e da própria população alemã. O chamado processo dos médicos fez parte dos Julgamentos de Nuremberg, promovidos após o fim da Segunda Guerra Mundial. No banco dos réus estavam proeminentes membros do Terceiro Reich.
Esse processo revelou um perverso sistema de destruição da consciência social alemã, que envolveu a institucionalização de condutas criminais em matéria de saúde pública, higiene racial e pesquisa humana. Participaram desses crimes profissionais da área de saúde, como médicos e enfermeiros, além de membros da indústria farmacêutica. Essas práticas violavam as condutas da Alemanha na época pré-nazista, quando o país tinha um forte respeito pela ética médica.
Em 1931, o Ministério do Interior do país sancionou as Diretrizes para Novas Terapias e Experimentação em Humanos, que incluíam os princípios da caridade e outros, proibindo a experimentação com moribundos e necessitados, financeira ou socialmente. Mas a partir de 1933, quando Adolf Hitler chegou à chancelaria alemã, a ética médica foi desprezada, com a devida cumplicidade e participação ativa da comunidade de saúde.
Durante o governo nazista, foram cometidas diversas atrocidades em nome da "ciência". Entre outras práticas, foram implementadas leis de segregação racial e proteção da raça ariana, programas de esterilização forçada, programas de eutanásia de deficientes mentais e físicos e experimentos médicos com pessoas deficientes e saudáveis presas em campos de concentração.
Após o julgamento de Nuremberg, em resposta às atrocidades cometidas, surgiu o primeiro código internacional de ética para pesquisas humanas. Foram estabelecidas novas normas para se realizar experimentos com seres humanos, incluindo principalmente a obtenção do consentimento voluntário da pessoa, que, a partir de então, é considerado a pedra angular da proteção dos direitos dos pacientes.
Ainda que esse código não tenha sido adotado formalmente como norma legal por nenhuma nação ou associação médica, sua influência sobre os direitos humanos e a bioética foi bastante profunda, já que sua exigência básica, o consentimento voluntário da pessoa, foi mundialmente aceita e está contida em inúmeras leis internacionais sobre Direitos Humanos.
Fonte: BBC
Imagens: Wikimedia Commons