A Grande Fome de 1921 fez com que a população apelasse para o canibalismo na Rússia
Um dos maiores desastres da humanidade aconteceu há pouco mais de cem anos. Foi quando mais de cinco milhões de pessoas morreram durante a Grande Fome que a Rússia enfrentou entre 1921 e 1922. A situação era tão desesperadora que há diversos relatos de cidadãos que apelaram ao canibalismo para sobreviver.
Safra ruim e confisco de grãos
A fome, que afetou principalmente as regiões dos rios Volga e Ural, aconteceu devido a uma conjunção de fatores humanos e naturais. A safra ruim de 1920 acabou agravada pela interrupção da produção agrícola que começou durante a Primeira Guerra Mundial e continuou com a Revolução Russa de 1917 e a Guerra Civil. As políticas bolcheviques do comunismo de guerra (que consistia em manter o Exército Vermelho abastecido com armas e alimentos) e da prodrazvyorstka (uma campanha para confiscar grãos e produtos agrícolas) terminaram de armar o cenário para uma tragédia humana em grande escala.
O partido bolchevique de Lenin acreditava que os camponeses estavam tentando minar os esforços de guerra e, ao tirar sua comida, tinha o objetivo de enfraquecê-los. O confisco em massa de grãos armazenados começou no inverno, desencadeando o início da fome em janeiro de 1921. Em muitos casos, a incompetência da administração local, que reconheceu o problema tarde demais, contribuiu para o agravar a situação.
A falta de alimento acabou resultando em canibalismo. Acadêmicos russos catalogaram exemplos de ingestão de cadáveres humanos e, em um relato, descreveram como uma mulher se recusou a entregar o corpo de seu marido porque o estava usando para comer. Os camponeses famintos desenterravam cadáveres recentemente enterrados para recuperar sua carne, além de comer grama e animais que antes eram considerados de estimação. A polícia não coibia a prática, pois o canibalismo era considerado um método legítimo de sobrevivência.
Entidades internacionais ofereceram ajuda humanitária para combater a fome, mas Lenin inicialmente recusou as ofertas alegando que não queria interferência externa no país. Mas, o agravamento da crise convenceu Lenin a reverter sua política. Ele decretou uma Nova Política Econômica em 15 de março de 1921, que tardiamente permitiu que organizações de fora trouxessem ajuda. A Administração de Ajuda dos Estados Unidos (ARA), junto a Cruz Vermelha e outras entidades europeias providenciaram assistência, alimentando milhões de pessoas.
Embora a situação permanecesse frágil, as condições começaram a melhorar lentamente após a ajuda internacional. Essa não foi a última vez em que a população soviética enfrentou uma grande fome. Nos anos 1930, durante o governo de Josef Stalin, houve o Holodomor (ou "Grande Fome Ucraniana"). Estima-se que entre 1,8 milhão e 12 milhões de pessoas tenham morrido na Ucrânia entre 1932 e 1933 devido ao bloqueio de alimentos imposto à região pelo ditador da URSS.