Mais de 70 mil pessoas foram confinadas em "campos de concentração" no Ceará
Publicado em: 22/07/2019
O recente tombamento do sítio arquitetônico do "Campo de Concentração do Patu”, no Ceará, revela um capítulo pouco conhecido da história do Brasil. No início da década de 1930, o local servia para confinar milhares de pessoas que fugiam da seca que atingia o nordeste. O objetivo era evitar que os retirantes chegassem a outras cidades, principalmente Fortaleza, capital cearense.
As ruínas da construção ficam na cidade de Senador Pompeu, a 270 quilômetros de Fortaleza. Oficialmente, 16.221 pessoas ficaram concentradas no local, sob alegação de que estariam sob a proteção do governo. De acordo com historiadores, lá elas eram expostas a uma série de sofrimentos e privações. Muitas delas morreram de inanição e de doenças, como tifo. Os retirantes também seriam explorados como mão-de-obra escrava, trabalhando de forma forçada em obras públicas.
Na época, outros seis campos com a mesma função foram instalados no Ceará. Ao menos 73.918 retirantes ficaram confinados nesses locais, segundo registros do jornal O Povo. “Foi absolutamente cruel, mas houve discursos humanistas. O discurso era que o confinamento seria para cuidar das pessoas, mas passaram a morrer oito, nove, dez pessoas por dia”, disse Kênia Rios, historiadora e professora da Universidade Federal do Ceará (UFC). Ela conta que resolveu estudar os campos de concentração para entender como os ricos tratam e isolam os pobres, em casos como esse.
O isolamento das pessoas de baixa renda dos grandes centros urbanos não era o único propósito dos campos. Na época, a ideia do darwinismo social era popular e ajudava a justificar iniciativas como essas. De acordo essa teoria, algumas sociedades seriam superiores às outras. Esse conceito motivou as ideias de eugenia, racismo, fascismo e nazismo.
O darwinismo social tinha entre seus seguidores Getúlio Vargas."Para se ter uma ideia, na Constituição de 1937, há um artigo [Art. 138] que diz que o Estado teria que 'estimular a educação eugênica'", disse Valdecy Alves, advogado e ativista dos direitos humanos, em entrevista ao portal Deutsche Welle. De acordo com ele, que é natural de Senador Pompeu, essa teoria era usada como justificativa moral para a implantação dos campos. Esses locais foram desativados em 1933. O número de mortos nunca foi oficialmente contabilizado.
Fontes: Deutsche Welle e EBC
Imagens: Gustavo Gomes/EBC/Reprodução e José Bonifácio P. Costa/Arquivo Nacional, via EBC