Não precisa ir à Rússia: a história conta os ataques às mulheres
Por Thiago Gomide do Tá na História
Parceria HISTORY e Tá Na História
Não é preciso ir à Rússia pra ver que as mulheres são atacadas por diversos homens há milênios. É só olhar pro lado. A história não foge.
Quer exemplos?
Há 90 anos, Alzira Soriano se tornou a primeira prefeita eleita no Brasil e na América Latina. Foi em Lajes, no Rio Grande do Norte. Você deve estar pensando: “ que baita conquista”. Aham, se ela não tivesse que enfrentar xingamentos do tipo “mulher pública é prostituta”.
O adversário vazou da cidade com vergonha da derrota.
No começo do século XX, havia diversas revistas e jornais dedicados a explicar as mulheres como elas deveriam se portar em casa, como elas deveriam ser melhores donas de casa.
Isso era endossado pelo código civil de 1916, que exigia que a mulher assumisse a condição de companheira do marido nos encargos de família. Sabe o que isso significa,né?
Em 1922, desafiando o pensamento patriarcal, a pintora Georgina de Albuquerque pintou uma obra em que a mulher se tornava a líder de um encontro político.
Impensável nesse período. Esse quadro, por muitos, foi considerado uma ofensa. Por muitas, revolucionário.
Somente dez anos depois, em 1932, as mulheres finalmente puderam votar. Pensando nacionalmente. A primeira eleitora considerada do Brasil foi a professora Celina Guimarães Vianna, em 1927.
E até chegar em 1932 não foi fácil não: em 1910, começou uma intensa luta no Rio de Janeiro, com a professora Leolinda Daltro, que tinha criado o Partido Republicano Feminista. Em 1922, ano do quadro da Georgina, a bióloga Bertha Lutz fundou a liga para Emancipação internacional da mulher.
Tanto Leolinda como Bertha foram chamadas dos piores nomes que você conhece. Aquela batalha era uma ameaça a família brasileira. Como a família ficaria com as mulheres independentes? Não é preciso ir à Rússia,né?
A turma fala que Getúlio que avançou com as garantias do voto feminino em 1932, mas esquece que o próprio, um ano antes, tentou limitar a participação das mulheres.
Só viúvas e solteiras com rendas próprias e mulheres que tivessem liberação dos maridos poderiam votar.
A grita foi tanta que, em 1932, foi liberada a participação para todos os gêneros a partir dos 21 anos de idade.
Hoje, pra você ver que o avanço é ainda lento: o Brasil ocupa a posição de número 115 no ranking mundial de presença feminina no Parlamento. 138 países foram analisados.
Carlota Pereira de Queiroz foi a primeira deputada eleita, em 1934. Foi eleita pelo estado de São Paulo.
Conservadora e rica, Carlota viu de perto o preconceito. Chegou ao limite de chamá-la de canhão. Piadinha inocente...Não é preciso voltar a 1934, né? Não é preciso ir pra Rússia.
Como também não é preciso de muito esforço pra entender que os direitos no casamento sempre foram desiguais.
Há 100 anos, o homem que decidia se a esposa podia ou não trabalhar. Se não tivesse liberação, esquece.
Em 1915, aqui no Brasil, após o casamento, o marido mandava nos bens da esposa. Isso significa fazer obras, alugar e até vender. A grana, claro, ia pro bolso de quem “mandava”.
O que não faltam são exemplos de mulheres que serviram de moedas para reis conseguirem mais poder, para famílias aumentarem suas áreas de influência...
Dona Leopoldina, Imperatriz do Brasil, não tinha menor vontade de casar com Dom Pedro I, por exemplo. Foi por causa de negócios.
“Ah, mas na época era normal?” Há quem defenda isso até hoje, quando luta contra o relacionamento da filha com alguém que não esteja no perfil imaginado.
Quantas vezes já escutamos – e há quem ache graça – de mulheres serem trocadas por camelos em países árabes. E garotas jovens serem trocadas por refrigerantes em Fortaleza.
Aqui no Brasil, durante muito tempo, as mulheres foram proibidas de jogarem futebol.
Não é preciso ir à Rússia pra lembrar de Zezé Motta sendo xingada por ser mulher, negra e interpretar Xica da Silva.
Não é preciso ir à Rússia pra ler notícias de tráficos de mulheres. Ou é?
Não é preciso ir à Rússia pra olhar pro lado.
É preciso trazer a Rússia pra entender o que a história não foge.
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THIAGO GOMIDE é jornalista e pesquisador. Foi apresentador e editor do Canal Futura e da MultiRio, ambos dedicados à educação. Escreveu e dirigiu o documentário "O Acre em uma mesa de negociação". Além de ser o responsável pelo conteúdo do Tá na História, atualmente edita e apresenta o programa A Rede, na Rádio Roquette Pinto ( 94,1 FM - RJ).
A proposta do Tá na História é oferecer conteúdos que promovam conhecimento sobre personagens e fatos históricos, principalmente do Brasil. Tudo isso, claro, com bom humor e muita curiosidade.